
quarta-feira, 29 de julho de 2009
Brisas frescas

sexta-feira, 17 de julho de 2009
Fui ao tapete!
Primeiro tiro no estômago. Hora de almoço. Restaurante chinês perto do trabalho. Arrisquei pedir o prato do dia. Uma espécie de galinha, com um molho castanho não sei de quê e arroz branco a acompanhar. A equação é simples: 'menu completamente chinês + empregadas de mesa que só falam chinês + cliente que não fala nem entende chinês = a cliente aos papéis'. Obviamente aos papéis. Tanto que queria um sumo de fruta e insistiam comigo que o almoço era servido com chá. Aparentemente chá quente. Gosto muito de chá. Mas não queria chá quente, como via na fotografia do menu. Queria sumo de fruta. Fresquinho. É impossível beber algo quente com este calor. Insisti uma. Duas. Três vezes e a resposta foi a mesma. A empregada pegava na lista, apontava para o prato e depois para o chá. Eu, apontava para o prato e depois para o sumo. Ela apontava de novo para o prato e depois para o chá. Eu sorria. Ela sorria. Eu não a entendia. Ela também não me entendia. Eu morria de fome. E se assim continuasse ela morreria de tédio. Deixei-me disso e venha então a galinha com o molho e o arroz mais o chá quente.
Nem dois minutos passaram e tenho a entrada na mesa. Uma mistura de gelatina verde com doce. Para entrada? Deixei-me disso e soube-me pela vida. Mas teria calhado melhor à sobremesa. Nem dois minutos passaram e tenho o prato na mesa. A galinha um tanto para o plana, espalmada. Parecia um bife. O molho em cima. O arroz por baixo. Plana e espalmada porquê? Não dava para distinguir asa, perna, peito, nada. Plana e espalmada. Deixei-me disso e ataquei. Um toque de coentros, cebolinho, pimenta, molho agridoce. Nada mau. O chá apareceu ao intervalo. Afinal era gelado. Ice-tea de ervas. E que maravilha de ice-tea. Para que conste, a fotografia do menu onde estava o chá mostrava um bule com água a ferver...
Regresso ao trabalho com uma leve indisposição. Dor de cabeça ligeira. Ligeira dor de estômago. Duas horas mais tarde o dobro da dor de cabeça. O dobro da dor de estômago. Três horas mais tarde, dor de cabeça insuportável. Dor de estômago insuportável. Pedi para sair mais cedo. Esperei um táxi na rua. Passaram uns dez. Nenhum livre. Passou um autocarro e em 10 minutos estava em casa. Não demorei muito a estrear a loiça da casa de banho. Sim... vomitei o almoço todo. Fui pela primeira vez ao tapete em Macau. Foi da comida? Não sei...
Para não correr o risco de enjoar o leitor, mudemos de assunto. Alguns dias antes arranjei casa. Bem perto do Largo do Real Senado, praça de traços portugueses no centro da cidade. Vi umas quantas. Em Macau e na Taipa. Na Taipa, atravessando uma das pontes, entrei em condomínios privados com piscina e health-club. Podia ter optado por aí. Mas preferi mergulhar no Macau profundo. Morar no centro. Vizinhança chinesa. Pelo menos neste primeiro ano de adaptação. Se é que algum dia estarei devidamente adaptado.
Mais central não podia ser. Rua Central. Algumas portas acima da Polícia Judiciária. Edifício Pou Kei. Todos os prédios têm nome próprio em Macau. Trata-se de um duplex, no quarto e último andar. Estilo ocidental. No andar de baixo está a sala, o quarto e uma casa de banho. No andar de cima, a cozinha, um pequeno lounge e outra casa de banho. Também um terraço com vista para as redondezas. Para os prédios do lado. Apartamentos onde as grades predominam. Grades de ferro. Austeras. Algumas varandas parecem gaiolas de pássaros humanos. Dizem-me que assim é por causa de uma vaga de assaltos nos anos 90. A vaga dos 'homens-aranha'. Vejo prédios com 30 e mais andares. Grades até ao último piso. É estranho. Esteticamente feio. Mas não tenho grades em casa. Foi uma das condições que impus ao porreiro e prestável promotor imobiliário. Português de Cascais. “Sem grades”. Tenho então um terraço com vista para os prédios vizinhos. É fim de tarde. O calor e a humidade continuam transcendentes. Ainda vislumbro uma colina onde jaz uma bonita igreja rodeada de árvores. Hei-de lá dar um salto.
O duplex é arranjadinho. Um pouco caro. 7000 patacas. Cerca de 700 euros. Não tive grande tempo nem paciência para procurar casa. Por isso teve mesmo de ser este. De todos os que vi foi o que mais me agradou. A vizinhança nos andares de baixo é toda chinesa. Cada porta tem um altarzito de um Deus qualquer e um pequeno incinerador. Ao lado dos altares há pratos com fruta. Alguma podre. Comida para os antepassados. Nos incineradores queimam-se notas falsas. Dinheiro para os mortos. Também abundam os pauzinhos de incenso. Já estou avisado que por altura do ano novo chinês são refeições inteiras junto a cada altar. Pratos quentes, em honra dos que já lá vão. Não quero imaginar o cheiro das escadas nessa altura.
Já tenho casa e isso é o mais importante. Casa e trabalho. Roupa lavada ainda não porque a máquina está em chinês. Terei de pedir ajuda. Faltavam lençóis e toalhas mas também já está resolvido. Lençóis padrão Louis Vuitton. Uma espectacular aquisição no Mercado Vermelho, uma espécie de feira de rua na zona Norte da cidade. Comprei Louis Vuitton só pelo gozo da coisa. Uma falsificação de qualidade impecável. Flawless. A 260 patacas o conjunto inteiro. Tentei ainda seleccionar um par de artigos para casa num armazém japonês mas não aguentei cinco minutos. Versão oriental de Tony Carreira aos berros nas colunas e prateleiras carregadas de bugigangas que não descortinei para o que servem.
Pelo meio tive ainda de recorrer à banca. Abrir conta. Aliás, duas contas. Uma no Banco Nacional Ultramarino – BNU – onde os portugueses normalmente depositam as patacas. Outra no Banco da China para onde seguem os reembolsos do seguro de saúde. [Tem estilo não tem? Ter uma conta no Banco da China? Eu acho que tem... mas não foi fácil]. Mais uma vez problemas de comunicação com o interlocutor. Pela frente uma muito simpática e paciente chinesa de meia-idade. Ria-se muito. Sempre que eu abria a boca ria-se como uma perdida. “Pedlo Joulgé? Ahahhahahahaha!”. “Jounauist? Ahahahahahaa”... e por aí fora. Falava um inglês atabalhoado. Falar nem é o termo correcto. Debitava meias palavras num inglês atabalhoado. Mas lá nos entendemos.
Tenho patacas no Banco da China. E a partir de agora o céu é o limite.
* Crónica publicada no portal Observatório do Algarve em 17 de Julho de 2009.
Crónica em imagens
Banco da China
sábado, 11 de julho de 2009
Vem aí um tufão

segunda-feira, 6 de julho de 2009
Lost In Translation
A piscina aquecida fica no mesmo andar. A funcionária, sorriso rasgado de olhos em bico, tenta explicar-me o horário em inglês. “From seven to line”. “Line?”, pergunto. “Yes, line”, responde. “Nine?”, insisto. “Yes, yes, line”. Que delícia! Braçada para lá, braçada para cá, algumas piscinas depois sento-me e observo. Três mulheres e dois homens. Nadam todos de forma desajeitada. Muito devagar. Em câmara lenta. Parecem estar ali há séculos. Nesta altura sou um Bill Murray em Lost in Translation. Muito Lost in Translation.
Regresso ao quarto cansado, ainda mais zombie. Desta vez durmo. Pouco. Apenas uma horita e meia. Há coisas combinadas e é preciso tratar de burocracia. Papelada relacionada com os serviços de migração. Dar uma volta pelas agências imobiliárias à procura de casa. Abrir conta no banco.
Na rua é tudo ainda mais estranho. Nomes das avenidas em português, painéis das lojas e publicidade em cantonês, mandarim... para mim é tudo chinês. Não entendo patavina. Tirando os anúncios Prada, Dolce&Gabanna, Rolex, Adidas, Nike, coisas desse género. O Cristiano Ronaldo aparece aqui e ali, em cartazes de publicidade.
Atravesso prédios carregados de grades até ao último piso. Andaimes de construção em bambú. Casinos que são arranha-céus. Gente. Muita gente. Macau tem perto de 500 mil habitantes. Dez milhões de turistas todos os anos.Tudo isto em 28 quilómetros quadrados. Diz a Wikipédia que é a cidade com maior densidade populacional do mundo. Dá para ver, cheirar e sentir. Acotovelo alguém aqui e acolá.
Nesta altura, por volta das duas da tarde, o bafo de calor é ainda mais húmido e brutal. Pode parecer estranho mas estou mais habituado. Tratada alguma burocracia, aproveito para embrenhar-me nas ruelas. Todos os estabelecimentos comerciais tem incenso à porta. Há recantos espirituais, pequenos santuários, porta sim, porta não. Mais incenso no ar. A caminho das ruínas da Igreja de São Paulo, ex-libris turístico da cidade, vende-se pescoço de porco grelhado. Fico-me pelo lemon ice tea. É fresquíssimo e excelente. Aprecio as ruínas ao anoitecer. Um pedaço de fachada que deixamos por aqui. É tudo novo. Um admirável mundo novo. Pelo menos para mim. Estou aos pulos por dentro.
O estômago aperta e a opção recai sob um restaurante de esquina. Pauzinhos. Frango grelhado com arroz e sumo de maracujá por cerca de 35 patacas. Não chega a 3,5 euros. Ambiente jovem. Miúdas giras. Chinesinhas influenciadas pela moda ocidental. Acho que nunca vi tantas mini-saias juntas. Traços muito diferentes. Exóticos.
Começa a chover. Chuva tropical. Do céu desabam parafusos de água quente. Logo hoje! Soube de véspera de uma festa ao ar livre integrada no evento This Is My City 09, uma espécie de festival organizado por uma associação cultural portuguesa de Macau, no Albergue da Santa Casa da Misericórdia. Que se lixe a chuva tropical. Cheguei ao espaço, de bonita arquitectura colonial, encharcado da cabeça aos pés. Não tinham passado dois segundos e tinha uma cerveja na mão. “Open bar”, diz-me um chinês sorridente, com óculos pretos, de massa. “Great”, agradeço, satisfeito, apesar do estado lastimável da minha indumentária. Macau Beer. Cerveja de Macau. Nada de especial, mas devo ter bebido umas seis ou sete. Não havia alternativa. Ainda não tinha acabado uma e o chinês sorridente dos óculos de massa estendia o pulso com uma “Macau biã”. A festa que era para ser ao ar livre foi acontecendo nos recantos mais abrigados. De dois em dois minutos alguém dançava na chuva, pés descalços. Ar de felicidade. Chuva, calor, humidade. Tudo muito estranho. Cada vez mais, agradavelmente estranho. Não dancei à chuva. Tirei as medidas à fauna. Portugueses, chineses, macaenses, mais um ou outro estrangeiro, uma mistura engraçada. Conversa-se em cantonês, português e inglês. Acabou a festa e ainda fui beber uma cerveja do Laos a um barzinho simpático. Dormente como estava não demorei muito a regressar ao hotel. Madrugada fora. Ainda aquele bafo de calor. Ainda aquela humidade. Cada vez mais habituado. Cinco minutos a pé – em Macau tudo é perto – e tinha o bicho de sete cabeças à minha frente. Outra vez a cama. Aquela cama. Será que é desta? Foi mesmo. Dormi umas horitas. Mas ainda não foi que nem um menino.
*Crónica publicada no portal do Observatório do Algarve em 06/07/2009
Festa no Albergue
Festa grande programada. This is My City 09 Macau. O problema foi a chuva tropical que desabou em pleno Albergue da Santa Casa da Misericórdia. Nada que demovesse estes convivas. Alguns dançavam à chuva. Bebia-se Macau Beer em bar aberto. O espaço é muito bonito, estilo colonial a fazer lembrar outros tempos.
Pequeno-almoço oriental
Tão longe e tão perto
