quarta-feira, 29 de julho de 2009

Brisas frescas

Tenho andado atarefado com o ritmo de trabalho. Entrar no ritmo de trabalho. Por isso, em jeito de novidade, deixo um artigo publicado no jornal Hoje Macau sobre a nova etapa neste lado do mundo.


Brisas Frescas

"Quem vem do mar arrasta sempre mais sal do que quem pisa terras de água doce. Talvez porque os olhos, tal como as ondas, viram a inocência de quem quer mudar o mundo e se deixar mudar por ele. Sem pressas de chegar a porto seguro. Desde 1 de Julho que chegou a Macau um vento fresco. E já entrou na sua casa. Rita Tavares-Teles e Pedro Maia são dois peixes à descoberta da Ásia (e de uma piscina para dar um mergulho), dois jornalistas à procura de histórias com gente dentro e com vontade de trabalhar pela cidade. São os novos (e bonitos) rostos do canal português da Televisão de Macau.

A história dos dois cruza-se em Paris. Dia 13 de Agosto de 2007: chega a última equipa a ser recrutada para o extinto canal de língua portuguesa para os lusófonos da Europa, a CLP-TV. Ele ia para o desporto, ela para o que houvesse. "Lembro-me do primeiro dia. Apanhei o metro com toda a antecedência para chegar a horas. Enganei-me. Fui na direcção oposta até ao fim da linha", conta Rita. O atraso afinal não existia (a equipa só entrava mais tarde), nem a ansiedade cegou o encantamento, o "impacto de sair do metro e ver a Torre Eiffel e pensar que todos os dias a ia voltar a ver". A memória "yin".

"Cheguei e caí de para-quedas no campeonato do mundo de râguebi. Lá consegui pôr os franceses a falar da equipa portuguesa, os Lobos, que participavam pela primeira vez", conta Pedro, o "yan" da memória. Ele andava atarantado há procura de casa; ela já há meio mês que alugara um tecto à distância. "Cheguei com a chave da minha casinha, o meu pai e o meu gato e instalei toda a gente", conta Rita.

Da cidade das luzes, saltaram para a cidade dos néons. Cada um tem o seu livro à espera de ser aberto e Portugal é o país que apetece pouco quando se está na casa dos vinte.
Ela evitou saber o que era Macau antes de cá chegar, mas também imaginou a cidade. "Estava à espera de uma Hong Kong em ponto pequeno. Não achei muito cosmopolita. Os prédios não estão arranjados, estas gaiolas...", aponta para as grades numa janela. "Para ser sincero, não me identifico com a confusão das ruas. Cada vez gosto mais de Macau, mas a poluição é coisa a que dificilmente me vou habituar", acrescenta Pedro.

Nem um, nem outro têm ar de gente de cidade. Há sempre mais sal e mais sol em quem vem do mar e o Algarve foi o último porto dos dois. "É tão estranho estar este calor todo e não ter uma praia", comenta Rita. "Desde que vi a piscina do hard Rock que sonho todas as noites com ela.Para as pessoas ligadas ao mar, é mais duro. Mas aqui há muito para viajar e muitas praias à volta", avança Pedro.

E, em Macau, o que prendeu o olhar de amêndoa da menina que queria ver a Torre Eiffel todos os dias? "Diz-se que os chineses não são muito dados ao tacto. Estive na Praça de Tap Seac e encontrei cães a brincar com os donos, filhos com os pais, irmãos mais velhos com os mais novos. Todos se riam. Encontrei uma praça de afectos. Foi um momento muito bom", descreve Rita. O conforto, continua, repete-se no olhar de quem a encara agora na rua. A estadia na Ásia servirá para aprender a devolver a empatia. "Tenho de encontrar o outro ponto de vista. O mundo não é uma bola ocidental. A Ásia é agora a minha casa. Já não sou a europeia para quem a China está longe", refere.

Também Pedro quer ser uma esponja. "Quero absorver uma cultura diferente. Quero viajar neste lado do planeta. Quero contribuir para que a TDM consiga refrescar a imagem que tem. Gente nova refresca sempre um canal", diz. Apesar de ter chegado à profissão por acidente (a inscrição na licenciatura deveu-se a uma antiga namorada), tomou-lhe o gosto. Começou num jornal regional do Algarve, esteve na SIC e TVI. Gosta de passar mensagens. Mal atracou em Macau e já queria ser útil à cidade e entrar no plano de protecção civil. "Estava em pulgas para que aparecesse um tufão de sinal oito", calhou-lhe um de nível três.

Já Rita, que fez escola no diário de Notícias, Público e TSF, é mulher de outras emoções. Voltamos ao "yin" e ao "yan". Na CLP-TV, gostava de sentir que as pessoas depositavam confiança em mim. Sabiam que eu ia transformar a vida delas, o esforço que fizeram, a relação com Portugal, numa boa peça de televisão. "Sabiam que eu ia respeitar aquela história", frisa.

Os dois estão habituados a dar notícias para quem está fora do país, mas no mundo novo tudo é diferente. Afinal, estão na cidade onde um dono de um café desenha um retrato para fazer companhia a uma nova jornalista que bebia sozinha um chá, e um rapaz que toda a vida foi do Vitória de Guimarães é convidado para vestir a camisola do Sporting e treinar para entrar na Bolinha. Macau sã assi; à Paris, c'est pas comme ça."

Por Sónia Nunes in Hoje Macau em 24 de Julho de 2009
http://www.hojemacau.com

2 comentários:

  1. muito bonito o artigo, gostei. só não sei se é abonatório o comentário "nem um, nem outro têm ar de gente de cidade.".

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  2. parabéns aos dois pelo artigo e pela vossa aventura fantástica

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